Constantemente, os entes políticos, com o fim de buscar maior arrecadação para o fisco, criam indevidamente normas, ou mesmo desvirtuam outras já existentes, inclusive com o desvirtuamento de inúmeros institutos do Direito, principalmente em momentos de crise como o que estamos vivendo. E é justamente nesses momentos de crise que as sociedades empresárias devem buscar um upgrade financeiro, sendo este não necessariamente advindo de sua atividade fim, mas sobretudo de reposições de gastos indevidos com tributos que foram arcados por conta de atitudes irresponsáveis de governantes.
Nesse sentido, destaca-se na atual conjuntura a cobrança indevida de Contribuição Social pelos empregadores, com alíquota fixada de 10% (dez por cento) sobre o montante de todos os depósitos devidos de FGTS do trabalhador demitido sem justa causa. Para chegarmos à conclusão pela inconstitucionalidade e ilegalidade da referida cobrança, façamos uma breve análise da criação do referido tributo e de toda a sua imposição até os dias atuais.
No ano de 2001, durante o governo Fernando Henrique Cardoso, foi sancionada a Lei Complementar nº 110/01, a qual instituiu, em seu art. 1º, que a
[…] contribuição social devida pelos empregadores em caso de despedida de empregado sem justa causa, à alíquota de dez por cento sobre o montante de todos os depósitos devidos, referentes ao Fundo de Garantia do Tempo de Serviço – FGTS, durante a vigência do contrato de trabalho, acrescido das remunerações aplicáveis às contas vinculadas.
A referida norma foi criada com o intuito de viabilizar o cumprimento de uma determinação do Supremo Tribunal Federal que obrigou a União a indenizar os trabalhadores por perdas de rendimentos dos valores depositados no Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS), no período compreendido entre o fim de 1988 (dezembro) e o início de 1989 (fevereiro) e durante o mês de abril de 1990 – momentos correlatos aos Planos Verão e Collor II –, de modo que, até dado momento, a referida Contribuição Social cumpriu com sua finalidade e vinculação – naturais deste tipo tributário.
Vale mencionar que a exposição de motivos da criação da Lei Complementar que instituiu o dito tributo é bem clara ao apontar para a reposição das perdas como grande fundamento da criação da norma e instituição do tributo. Entretanto, deve-se relembrar sempre a obrigatoriedade de vinculação e finalidade que existem relativamente às Contribuições Sociais e que o desrespeito a qualquer dessas duas premissas ensejam a ilegalidade e a violação ao texto da Constituição Federal.
Ocorre que, pela observância do Relatório de Administração do FGTS de 2006, bem como de análises de especialistas, e também dos Demonstrativos Contábeis do FGTS de 2006, a reposição dos valores que deu azo à instituição da aludida Contribuição Social encontra-se superavitária, ou seja, foi alcançada a finalidade de adimplir as perdas dos rendimentos nas contas vinculadas.
Por consectário lógico, toda a arrecadação das Contribuições Sociais deve, necessariamente, ser destinada àquela finalidade prevista em lei, sem exceções. Assim, conforme o Relatório de Administração e os Demonstrativos Contábeis mencionados, o fim previsto em lei já havia sido alcançado, uma vez que todas as perdas inflacionárias já tinham sido repostas e, ainda, havia sobras. Neste sentido, a cobrança do tributo não mais se faz necessária, nem legal, o que torna sua manutenção flagrantemente inconstitucional. Não resta outra alternativa constitucional, senão acabar com a cobrança desses valores.
Vale ressaltar que a manutenção indevida da cobrança não é o único dos problemas. No caso ora apresentado, obrigatoriamente, o montante arrecadado deveria ser especificamente destinado a repor as perdas inflacionárias dos planos econômicos. A vinculação da receita observada com o pagamento pelos contribuintes é obrigatória.
Mas a realidade não é bem essa. Atualmente, a referida contribuição sofre de outra mácula. Explica-se: no ano de 2012, após aprovação do Congresso Nacional de projeto de lei que previa prazo extintivo para a dita espécie tributária, a presidente Dilma Rousseff vetou o mesmo com base em equivocada justificativa, qual seja: os valores estavam sendo empregados no “Programa Minha Casa Minha Vida” do Governo Federal. Neste momento estava sendo gravemente desvirtuada a vinculação da receita anteriormente prevista na lei instituidora do tributo e obrigatória por força da Constituição. Diante disso, ou seja, pela utilização do produto arrecadado para fim diverso daquele previsto em lei, a cobrança também pode ser considerada como inconstitucional.
Cumpre ressaltar que pendem de julgamento Ações Diretas de Inconstitucionalidade propostas perante o Supremo Tribunal Federal para análise e decisão acerca da constitucionalidade da manutenção da cobrança do tributo nas demissões sem justa causa. Desse modo, é muito interessante para as sociedades empresárias que contam com largo quadro de funcionários a busca pela reposição dos valores que, supostamente, estão sendo pagos indevidamente desde o ano de 2007, tendo em vista os fatores acima delineados. Ou, na pior das hipóteses, desde o ano de 2012, quando o Poder Executivo Federal deixou, com uma clareza solar, que descumpre descaradamente a lei e surrupia o dinheiro dos contribuintes.
Assim, deve-se deixar claro que as sociedades empresárias devem buscar rapidamente tais soluções, já que as decisões do Supremo Tribunal Federal podem não contemplar indistintamente a todos a devolução dos valores, mas somente àqueles que já têm ações em curso, somente valendo para os demais a cessação das cobranças de um tributo que passaria a não mais ser devido. Por fim, o que deve ficar claro é que existem numerosos atos temerários e maliciosamente praticados pelo Poder Executivo na ânsia arrecadatória e que ferem a Constituição e os princípios do Direito Tributário. Nesse sentido, cumpre aos cidadãos e às pessoas jurídicas buscarem os seus direitos, minimizando as perversas consequências de um Estado que tanto insiste em lesar os direitos tão caros a cada um dos cidadãos.
Autor: Rubens Laranja Musiello — OAB/ES nº 21.939